Como a CET incentiva a reinclusão social de reeducandos do Sistema Penal

Vindos do Presídio Militar Romão Gomes, três reeducandos trabalham no CETET há um ano. Programa pioneiro é parceria com a Funap.


“Gratidão! Fomos acolhidos. Nosso trabalho, aqui, é zelar por este lugar, cuidando dos jardins, das motos e bicicletas.” Assim, o ex policial militar A.V.S.* expressa sua satisfação por integrar um programa pioneiro da CET, que firmou uma parceria com a Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel (Funap), vinculada à Secretaria de Estado da Administração Penitenciária e cuja missão é o amparo ao trabalhador preso.
A iniciativa – concretizada em abril de 2018 com a assinatura de um convênio – foi da Superintendência de Desenvolvimento e Educação de Trânsito (SDE).
Marcada por um imanente caráter de reinserção social, a parceria coopera para a requalificação e o redirecionamento profissional de pessoas que estão condenadas pela Justiça cumprindo pena.
Após um ano, a contratação dos três reeducandos da Funap se mostrou vantajosa para ambas as partes. Para eles, detentos no Presídio Militar Romão Gomes onde cumprem o regime semiaberto, três dias trabalhados significam um dia a menos de pena. Recebem um salário mínimo, Vale Transporte e Vale Refeição. Para a CET, solucionou-se um problema de zeladoria, afinal, o espaço do CETET possui uma extensa área verde: jardins, árvores e gramados sofriam com a invasão, visível e frequente, de mato alto e insetos.
Ex PMs condenados pela Justiça, A.V.S. (também psicólogo de formação), M.A.S.S. (estudante de Direito) e M.A.P.L. (futuro fisioterapeuta) trabalham hoje no CETET prestando serviços de jardinagem e manutenção preventiva de motos, bicicletas e veículos elétricos utilizados nos cursos de educação de condutores.
Avaliação positiva – Em fevereiro, a área de pesquisa do Departamento de Educação na Rua, sob a coordenação da pesquisadora Lilian Rose Freire, concluiu uma sondagem de opinião sobre a presença dos reeducandos no CETET, na percepção dos empregados da CET lotados na Barra Funda. A qualidade do trabalho, a conduta e a postura social dos avaliados foram consideradas impecáveis, surpreendendo o corpo funcional.
Com vontade de aprender, foco na execução das tarefas e afinco, estão “mudando a cara do CETET”, no olhar de Morgana Krauzer, assessora da SDE que acompanha de perto o dia-a-dia desses reeducandos.
A rotina vai além: a presença deles já resultou na confecção de um armário de ferramentas para a Gerência de Administração da Frota (GAF) e, atualmente, dedicam-se a fazer um pomar e uma compostagem.
“Outro dia, ouvi um aluno do Pilotagem Segura comentar com outro: ‘Olha como as motocicletas estão limpas e bem conservadas´, aí eu ganhei o dia”, afirma M.A.P.L.
Seleção rigorosa –  A Diretoria da CET aderiu à proposta do programa e autorizou a contratação. Dentre os critérios do processo seletivo, considerando-se que os escolhidos prestariam serviços no Centro de Treinamento e Educação de Trânsito (uma unidade escolar), foi balizado o seguinte:
  • Competência para a realização de serviços gerais;
  • Boa conduta anterior, atestada pelo Comando do Presídio Militar Romão Gomes;
  • Não envolvimento em crimes sexuais ou de violência contra mulheres ou crianças;
  • Não tivessem tido envolvimento com posse ou tráfico de drogas.
A preocupação social da SDE na formação profissional levou a CET a buscar cursos profissionalizantes, de modo a não aproveitá-los somente como mão-de-obra. Foi dessa forma que dois tiveram a chance de fazer cursos de jardinagem, paisagismo e arborização urbana na Universidade Aberta do Meio Ambiente e da Cultura da Paz (UMAPaz), da Prefeitura. A próxima extensão será de Estudo de Orquídeas, além de manejo de animais peçonhentos no Instituto Butantan ainda em abril.
Já M.A.P.L., que foca seu trabalho na oficina do DCO, passou por um treinamento oferecido pela CET na Bicicletaria Zanola, loja especializada situada na Zona Norte, que atendeu à solicitação da CET e acolheu o reeducando. Ele pôde aprender na prática em um dos centros mais avançados de manutenção de bicicletas da cidade, o que o ajudou a transferir tecnologia para as oficinas da Companhia.
A aproximação da CET com a Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente, através da UMAPaz, rendeu também uma doação feita pelo Viveiro Manequinho Lopes ao CETET, que recebeu recentemente 1.072 mudas ornamentais de diferentes espécies, como hera roxa, grama amendoim, dionela, clorofito e lambari.
Rotina no Presídio – Localizado na zona norte da capital paulista, na Vila Albertina, o Romão Gomes possui uma população carcerária de 376 PMs que vivem a disciplina de uma penitenciária militar. Todos os dias, o horário da alvorada (hora de acordar) ocorre pontualmente às 6:00 e às 6:45 acontece a primeira revista. “Ao todo, são quatro revistas diárias; na primeira temos de estar com a higiene pessoal impecável, o fardamento aprumado e vestido, o cabelo penteado no corte padrão e a barba feita”, contam.
Às quintas-feiras é realizado o desfile matinal. O canto de hinos pátrios (um para cada manhã) é um dever realizado com a disciplina de qualquer unidade militar.
As celas são coletivas, e os próprios internos fazem a faxina do presídio para deixá-lo limpo e apresentável às visitas – o dia da visitação, quando familiares vão vê-los, é aguardado com muita expectativa.
Dentro da penitenciária, é permitido o trabalho em espaços de uso coletivo como a horta e a biblioteca. A leitura, aliás, é um hábito estimulado entre eles: “Dos livros que li aqui, Dom Casmurro (clássico de Machado de Assis) é o meu favorito”, diz M.A.S.S. A prática de exercícios físicos na academia é outro costume aprovado.
O Presídio Militar Romão Gomes é certificado com o Prêmio Polícia Militar de Qualidade – Grau Bronze e está, neste momento, procedendo a revalidação da ISO 9001 (foi o primeiro estabelecimento penal do país a obter certificação ISO). Além disso, o PMRG não tem registro de violência ou abuso entre presos ou contra os detentos. Os que já progrediram para o regime semiaberto têm autorização para sair pra trabalhar durante o dia e estudar à noite, devendo retornar ao estabelecimento prisional para pernoitar.
Do trio, A.V.S., o psicólogo, é quem está mais perto de progredir para o regime aberto. Fã de plantas, apaixonado por azaleias, pretende trabalhar com jardinagem no pequeno negócio que vislumbra abrir num futuro próximo. Ele aguarda ansioso o momento de se reinserir no mercado como microempresário.
*Os nomes foram abreviados a fim de preservar a identidade dos personagens desta reportagem, a pedido da SDE.

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